sábado, 20 de junho de 2009

Sobre O Que Seria O Amor.

 

      Ela só o amou porque era preciso. Ele só a amou porque não sabia definir o que sentia por ela. Para ela não morrer de tédio e ele de depressão. Para ele ter o que esperar e ela algo para acreditar. Para os dois preverem o futuro como fazem os videntes bem pagos. Para ter um passado bonitinho para lembrar. Ela ter a quem escrever coisas melosas e ele um motivo para criar sonhos impossíveis. Para fazer a social. Para fingirem conhecer alguém mais que a si mesmo, e, assim,  se sentirem menos só. Para brincarem de dizer “eu te amo pra sempre”. E terem companhia quando iam ao dentista. Para desconfiar do óbvio. E dizer verdades indefinidas com a honestidade dos que têm fé. Para se reconhecer. Para ela sorrir e ele, junto dela, chorar de felicidade.

       Por causa da adrenalina, da serotonina, da dopamina, dos feromônios, do estrógeno e da testosterona. Por causa do sexo. Do gozo. E da vontade de morrerem suados, ao mesmo tempo, um ao lado do outro. Ela quase esquecendo que era apenas por um tempo finito, ele quase esquecendo que era triste. Para fazê-lo compreender o que ela mesma desaprendia. Para fazê-la enxergar que o “amor” é incomensurável e, que talvez, podia mesmo ser maior que o finito. Para preencher o ócio com pensamentos em alguém. Para virarem melhores amigos. E serem perigosamente e totalmente sinceros um com o outro. Para brigar por besteiras só para fazerem as pazes e aumentar o tesão. Pelo desejo, puro. Para ficarem bestificados e atônitos. Para citar escritores que nunca existiram.

    Pelos ciúmes, o medo, o desgaste, a raiva e a posse. Por causa do prazo de validade. Por ela estar se tornando meticulosamente enjoada e ele insuportavelmente repetitivo. Pelo rabo da vizinha tornar-se de súbito mais interessante que os versos dela. Porque há tanta gente mais cativante e surpreendente que ele esperando para ser descoberta. Por “eu te amo” significar tanto quanto um “até amanhã”. Para ela aprender a mentir e ele aprender a perceber quando estão mentindo. Para nunca, nunca mais cogitarem a ideia de se auto-enganar. Para aceitarem, outra vez, que a tendência do que começa é, invariavelmente, acabar. Porque acaba. Para reencontrarem a tristeza e amadurecerem mais umas décadas. Para se procurarem em quem lhes encontrar.

      Para ele dizer: “espero que tu sejas feliz” sem mágoas. Para ela dizer: “obrigada pela felicidade” e achar que isso daria um texto. Para confirmar a tese de que o amor corrompe amizades raras e valiosas. Para ficar sem se falar uma semana. Para descobrirem outros e se apaixonarem de novo e de novo. Ao mesmo tempo, outro tempo, n’outro tempo. Para rirem de tudo, quem sabe. Para ele tornar-se mais comedido. Para ela tornar-se mais ela. Em nome da poesia, do lirismo, do inexplicável, do insólito, da coragem, da beleza. Para ter sido. Para brincarem de dizer: “porra, mas eu te amei pra caralho”. E terem alguma certeza, enfim. Para descobrir que as verdades são momentâneas e as mentiras são apenas vontade de ser feliz. Ou  tudo isso vice-versa. Sei lá.

16 comentários:

Marie disse...

É um dos textos mais lindos que já vi na vida.

Por ser carente, por ter sorrido e chorado conforme tudo ia terminando... ou começando, sei lá.

Por saber que amores que não passam, pesam... e ainda assim, depois de uma semana, acreditar de novo em tudo e viver tudo mais uma vez... de novo e de novo.

Um beijo!

Unknown disse...

também acho que deves sim :)

um beijo *

Filipe Garcia disse...

Dom bonito, esse o seu: o de entrar dentro de mim, arrancar tudo o que eu sinto, o que eu vivo e colocar aqui, em letras. Tradução? Sim, filme em legenda de alguns dias que me perseguem, exatamente igual ao descrito.

Juliane Farias disse...

Adorei o texto. Que profundidade!
bjs
Goretti

Michele disse...

Acaba mesmo.

Jaya Magalhães disse...

O que seria. O que não é.

Epifania. Hipocrisia.

Não existe, esse tal de amor.

[Nunca vi, nem vivi, e só acredito quando assim for. E se o que for pra ser, se resumir ao que aqui foi exposto, continuo a dispensar].

Beijo, moço.

Verônica Heiss disse...

Os teus textos sempre são os mais lindos que eu já vi na vida. Porque eu paro e leio a mesma frase várias vezes, porque me sinto uma fraude. Eu fico pequenininha perto dos teus escritos. Vc tem verdade demais e se assume. Quem sabe um dia eu chegue perto disso.

Ryuji disse...

Muito bom esse texto.
De verdade. Até me reconheci em alguns trechos... enfim.
Já confirmei a tal "tese de que o amor corrompe amizades raras e valiosas" e posso dizer que tento desde então nunca mais cometer esse mais terrível dos enganos.
Enfim.. muito bom teu blog.
Ainda volto.
Abraços!

Byers disse...

Fala Tiago meu bom rapaz! rs

Oh eu recebi uma homenagem com um selo, e to repassando pra vc! :) Não so de participar dessas paradas de selo mas como eu ganhei um de uma pessoa muito querida e a proposta eh bacana to aderindo.

:) gosto muito do seu blog pq vc traz uns questionamentos bem sinceros.

E amanha dia 23/06 eh o lançamento oficial da segunda edição da Sunshine!

Espero que goste do resultado!

Melina F. disse...

Me envergonho do que escrevo. Não é nada perto das tuas confissões, da tua ampla visão das coisas. Não costumo elogiar desse modo os blogs que visito, mas você me impressiona demais. É lindo.

Michele disse...

De nada pela atenção, seu blog foi recomendado, parabem..

e, bom, elas só sabiam de cada pausa pq eu já tinha fofocado a história toda que tá camuflada por trás. Coisa de mulher, rá

Anônimo disse...

ISSO é tão FY

Kah disse...

Nossa!
O que dizer além de nossa, creio que as vezes as palavras calam diante da verdade!
Seu texto...Nossa...
Vou acompanhar-te

. disse...

"Pra ela dizer: "obrigada pela felicidade" e achar que isso daria um texto."
Aahahaha!

João Romova disse...

Esse foi um dos poucos textos que vi em blogs que eu, subtamente, pensei "eu é quem devia ter escrito isso"

Bang. disse...

Gostaria de saber se é assim.