sexta-feira, 3 de junho de 2011

Se dando com respeito.

      Otávio estava suando frio desde às sete, quando desligou o celular e imediatamente se arrependeu de tê-lo usado. Quem lhe deu o telefone de Adriana foi Mauro. Ele assegurou que a moça era muito discreta, educada e que só atendia clientes classe A. Otávio há cinco meses estava divorciado. Seu casamento durou dez anos, terminou porque ele e a esposa simplesmente pararam de se suportar. Não tiveram filhos. Sem muita criatividade e com pouquíssimo tempo, pagar pensão para a ex pareceu lhe pareceu uma boa forma de gastar as excessivas sobras de seu dinheiro. Otávio sentia falta da mulher e não se relacionou com ninguém desde o dia em que saiu de casa. Mauro disse que ele precisava transar para aliviar o estresse do trabalho. Sabendo da inabilidade do amigo para conquistas e dos riscos de se envolver com aproveitadoras, indicou-lhe Adriana. “Ela é muito gostosa, tu não vai te arrepender!”, disse a Otávio.

      Chegou a ligar novamente para desmarcar, mas desistiu antes de Adriana atender porque percebeu que estava muito intrigado. Nunca havia conhecido uma garota de programa até então. De repente, foi tomado por uma curiosidade quase infantil: “como será que ela é?”, “sobre que assuntos ela deve conversar?”, “será que ela é vulgar ou faz a linha fina?”, “será que ela fica triste depois do programa?”. Ele tinha quase certeza que não conseguiria transar com ela. A ideia de pagar para consumir sexualmente outro ser humano não lhe agradava. Julgou que, mesmo transpondo as barreiras morais, a disputa entre sua consciência e a vontade lhe renderia uma boa brochada. De qualquer forma, pagaria o combinado para passar o tempo conversando com Adriana. Pensou até em pedir um strip, se sua timidez permitisse, mas duvidava ter estômago para passar disso. Pensava nas possibilidades quando Adriana tocou a campainha pontualmente às 22h.

      Adriana tinha cabelos loiros, muito lisos e era extremamente branca. Mauro não exagerou quando disse que a moça era gostosa, mas não tinha mencionado o quanto seu rosto era lindo. Otávio ficou olhando aquela menina que, pela idade, poderia ser sua filha e não sabia o que fazer. Adriana vestia uma calça jeans justa, uma blusa vermelha decotada e estava de salto. Ficou parada à entrada da porta esperando pelo convite de entrar, olhando desconfiada para Otávio. Pensou que havia errado de apartamento. Perguntou a ele se estava no lugar certo e, mesmo depois de receber a confirmação, continuou confusa porque Otávio não esboçava nenhuma reação. Ele ficou lá, parado, olhando com certo espanto para moça e se censurando pelo que fez. Não conseguia dizer nada, nem mesmo pedir para que ela se retirasse. Julgou que não era para tanto, mas sentia-se insuportavelmente constrangido. Adriana pediu para entrar e Otávio, tremendo, apenas virou o corpo para lhe dar passagem.

_ Tu és o Otávio mesmo?

_ Sou sim...

_ Hum... É a primeira vez com uma garota de programa, né?

_ Hã? Como tu sabe?

_ Haha. Experiência...

_ Olha, foi um erro ter te chamado aqui. Vou te pagar e tu pode ir, tá?

_ Como tu preferir... A gente pode só conversar, se tu quiser.

_ Não sei se é uma boa ideia, sabe...

_ Tudo bem, tu quem sabe.

_ É que eu não me sinto à vontade contigo.

_ Eu entendo... Tem esposa? Te sente culpado?

_ Tu é boa nisso mesmo, hein... Não tenho mais esposa, mas me sinto culpado do mesmo jeito.

_ Ah, não eu já me acostumei, sabe. Dei outro significado pro meu corpo, algo assim.

_ Como assim?

_ Perdi o pudor, entende? Meu corpo é como se fosse uma roupa que empresto pra os homens vestirem, às vezes. Haha.

_ Sei…

_ Não, tu não sabe.

_ É que… É tua intimidade... Não acredito que não te incomoda ser usada como se fosse um objeto.

_ Eu não. Tem gente que vende sapato, celular, carro, computador... Eu vendo meus buracos. Claro que o início foi difícil, mas me acostumei e agora até gosto. Dá uma puta grana. Haha.

_ Não sente nojo?

_ Nojo eu sinto de gente hipócrita e falsa moralista. Eu gosto mesmo de grana e de trepar. Acabou-se. Suor, pau e porra são besteiras pra mim. Tem alguma coisa pra beber aqui?

_ Claro...

      Conversaram e riram até 1h. Depois de beberem, ele finalmente se soltou e conseguiu se sentir à vontade com ela. Teve vontade de transar, sim, mas deduziu que o papo seria mais prazeroso que sexo. Ela tinha um jeito estranho de ver as coisas e Otávio se esforçou sinceramente para compreendê-la. Otávio foi pondo de lado um a um seus preconceitos na medida em que Adriana foi lhe surpreendendo. Ela lhe contou que gostava de trabalhar com sexo, mas que não era iludida: sabia que seu corpo perde o valor conforme passa o tempo e que já estava a cinco anos fazendo uma poupança para montar uma sex shop de luxo. A princípio ele pensou que toda autoconfiança de Adriana era apenas um disfarce que usava para esconder suas mágoas. Depois percebeu que ela era realmente bem resolvida porque, diferente de quem a julgava, não levava seu trabalho a sério. Adriana tinha aquela sabedoria que adquirem os que se fodem muito antes de aprender como encarar a vida.

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