sábado, 24 de setembro de 2011

Besta.

 

      Ela ama de um jeito cínico. Dá como se não se importasse em receber e dispensa como se eu não fizesse falta. Talvez não faça mesmo e eu queria me convencer do contrário por conta de um otimismo infantil. Quem sabe só sirvo pra suprir carência, pra passar o tempo, pra afagar o ego e ouvir quando ela resolve falar. Sou uma peça substituível que cumpro minhas funções, quando solicitada, e mantém a vida dela nos eixos. Não me importo, gosto de não ser necessário, nem minha vaidade se incomoda. É bom não ser responsável pela felicidade de ninguém. Eu não quero ser importante por ser essencial, eu quero ter valor por ser alguém dispensável, mas que não se deve dispensar.

      Às vezes ela me confessa seus medos e eu até vejo alguma fragilidade, um pedido de amparo. Eu sei que é ilusão. Ela sabe, assim como eu, que ninguém pode protegê-la do imprevisível. Mas eu gosto de abraça-la contra o peito e dizer vai-dá-tudo-certo assim mesmo. Ela entende que eu não sei se vai dá tudo certo, mas me aperta como se desse jeito demonstrasse que deposita fé nas minhas palavras. E eu me agarro a ela com a força de quem acha que pode mudar o mundo. Meu orgulho fica pequeno e a minha censura deixa passar um pensamento ridículo desses impossíveis, dramáticos, que vem em momentos oportunos que deveriam durar pra sempre (tipo assim).

     No entanto, ela sai dos meus braços, me olha com um sorriso sarcástico e me chama de besta. Eu sorrio de volta querendo manda-la tomar no cu. Ela me beija com desleixo e diz tchau. Eu, besta, fico admirando ela ir embora, sem saber quando vou revê-la. Ela não precisa muito de mim e, sabe, sinceramente eu também não careço tanto dela... Não sou triste longe dela, eu só não sou feliz direito, mas quem é? Não se pode correr atrás disso porque o que torna essas coisas especiais é o fato delas fazerem falta: são raras, por isso têm valor. A tendência é as coisas se equilibrarem, eu não posso me sentir como quando a vejo sorrir o tempo todo. Não fosse ela seria outra, a questão é que ela é inevitável.

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