sábado, 3 de setembro de 2011

Fabiana.

      Vitor decidiu que iria se apaixonar por Fabiana. Ele achou que sua vida ficaria mais divertida se estivesse apaixonado por alguém. Não que sua vida fosse monótona: era uma vida normal, com uma rotina cansativa e distrações bobas que o mantinham são. Mas fazia algum tempo que Vitor se sentia apático, então imaginou que ter alguém em quem pensar antes de dormir e por quem ansiar deixaria as coisas mais interessantes. Escolheu Fabiana por três razões: ela era bonita, legal e tinha bom gosto. Necessariamente nessa ordem. Ele sabia que, além da própria Fabiana, milhares de outras mulheres se encaixavam nesse perfil. A questão é que ela já estava ali, enfiada no seu dia-a-dia, trabalhavam no mesmo lugar, seria mais prático e fácil. Além do mais, Regina já tinha namorado, Duda o achava insuportável, Mônica era antissocial demais e Jaque havia lhe dado um fora especialmente inesquecível. A paixão precisava ser consumada. Talvez o fator ‘falta de opção’ tenha influenciado um pouco na sua escolha. Porém, para Vitor, não importava se era A, B, C, D ou E, já que os sintomas da paixão são mais ou menos universais e, independente da fonte, os efeitos seriam parecidos.

      Depois de quatro meses, Vitor decidiu abortar seu projeto, mas aí já era tarde demais. Ele havia passado aquelas semanas reparando nas sutilezas de Fabiana: a forma como ela mexia nos cabelos, o formato de seus lábios ao sorrir, o jeito como mudava a entonação ao falar no telefone, o carinho com que admirava suas unhas recém-pintadas, a mania que ela tinha de respirar fundo fechando os olhos e levando a mão à testa quando ficava estressada... Vitor passou a enxergar beleza nos detalhes mais banais de sua pretendente. Antes de dormir, ficava olhando as fotos de Fabiana no Facebook. Tentava programar o inconsciente pra lhe pôr com ela numa casinha com lareira perdida no sopé de uma montanha, ou coisa parecida. Vitor estava convencido de que se apaixonar era apenas uma questão de condicionamento e concentração. Algo como prestar atenção no que é bom e tentar ignorar o resto. Ele só foi ter consciência da gravidade do que tinha feito quando tentou desfazer.

      Naqueles quatro meses, Vitor se aproximou de Fabiana, se tornaram bons amigos. Ele não queria ficar com ela antes de sua paixão maturar a ponto de ficar inconfessável, achava que assim seria mais bacana. Vitor era meio frouxo e muito burro. Fabiana era realmente uma moça muito legal e simpática. E mais linda do que ele havia reparado meses antes. A beleza dela cresceu proporcionalmente ao tempo que passaram juntos. Como nada havia acontecido entre os dois e só havia uma boa relação de amizade, Vitor não teve muitas oportunidades de se decepcionar. As circunstâncias e o tempo em que caberiam as frustrações só existia na cabeça dele. Ele preenchia esse tempo com fantasias doces encenadas em lugares bucólicos, como a superfície lunar, por exemplo. A situação era tão ridícula que se tornava um pouquinho deprimente: ele lá, tendo fantasias típicas de garotas recém-saídas da menarca, enquanto ela, sem suspeitar de nada, era incapaz de olhar o amigo com outros olhos. Aliás, Fabiana era tão incapaz de olhar o amigo com outros olhos que não quis mais ter o amigo quando ele se declarou tal qual um menino de quarta série.

      Foi um desastre. Vitor convidou Fabiana pra uma falsa festinha em sua casa e contou todo seu plano. Disse a ela que depois do primeiro mês as coisas saíram de controle e, mesmo se quisesse voltar atrás, já não poderia. Falou que queria ter dito antes, mas estava esperando o “momento certo”. Detalhe é que o “momento certo” nunca existiu, mas Vitor tinha fé nele. Sua esperança ingênua foi o suficiente pra fazê-lo aguardar por uma situação que, além dele mesmo ter forçado, poderia ter criado muito antes. Não que o resultado fosse diferente, mas seria menos idiota. Fabiana o desprezou com classe e delicadeza, explicou que não conseguia vê-lo de outra forma e que era melhor se afastarem por um tempo. Vitor ficou arrasado. Ele ficou repetindo pra si que igual a ela havia várias, que tudo aquilo era produto de sua carência, que Fabiana nem era tão bonita assim, que não havia nada de realmente especial nela e que seus dentes eram meio tortos e aquilo era horrível. Eram mantras que ele repassava enquanto se debulhava em lágrimas. Ir ao trabalho passou a ser uma tortura. Entrar na internet era martírio. Ver Fabiana lhe arrancava suspiros de agonia. Vitor, então, descobriu que com paixão não se brinca e que ele era fraco e muito dramático. Ao menos substituiu a apatia por sofrimento. Pouparia tempo se tivesse ido num desses respeitáveis clubes sadomasoquistas: lugares onde não devem cobrar muito pra desfrutar do prazer de sentir uma mulher enfiando o salto agulha no seu peito.

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